quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

CONTRATO DE COMODATO ENTRE EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO

Em razão da alta carga tributária, algumas empresas estão buscando alternativas para minimizar os custos fiscais de determinadas operações.

Uma das opções adotadas pelas empresas que pertencem a um mesmo grupo econômico é o empréstimo de bens entre elas (móveis de escritório, computadores, ar condicionado, etc). Tal prática é utilizada quando os bens em excesso numa empresa podem ser utilizados para a instalação de uma filial, por exemplo, ou bens que foram adquiridos em um local podem ser encaminhados para outro onde está localizada a outra empresa, sem a incidência de impostos, pois a circulação de bens a título de comodato não gera tributação[1], conforme dispõe a Súmula 573 do STF: "Não constitui fato gerador do imposto de circulação de mercadorias a saída física de máquinas, utensílios e implementos a título de comodato” e, no mesmo sentido tem se manifestado o STJ e o TJRS[2].

Cumpre esclarecer que para caracterizar corretamente o comodato e não se presumir fraude ou não haver a incidência tributária, o bem, objeto do comodato, que pode ser móvel ou imóvel, tem que ser não fungível, isto é, que não possa ser substituído por outro da mesma espécie, quantidade e qualidade, porque a lei assim exige. Desta forma, ao final do contrato, o(s) próprio(s) bem(bens) emprestado devem ser devolvido(s) ao comodante.

O comodato é um contrato unilateral, porque gera obrigações apenas para o comodatário; é um empréstimo gratuito, porque o comodatário não paga nada ao comodante; e se perfaz com a tradição do bem, isto é, com a entrega do bem, sem transmitir a propriedade, conforme preleciona o art. 579 do Código Civil[3].

Por ser contrato gratuito, o comodante não poderá cobrar qualquer valor pelo empréstimo dos bens, porém, o comodatário tem obrigação de conservar e guardar a coisa emprestada como se sua fosse; responsabilizar-se pelas despesas normais com o uso e gozo da coisa emprestada e sem direito ao seu reembolso; limitar o uso da coisa emprestada ao estipulado no contrato ou de acordo com a sua natureza; e quando constituído em mora, além de responder pelo bem emprestado, pagar aluguel da coisa durante o atraso na devolução, conforme determina o art. 582 do Código Civil[4].

No caso de furto ou extravio dos bens objeto do comodato é dever do comodatário fazer a restituição do bem ao comodante, ou por outro da mesma espécie, quantidade e qualidade (única hipótese em que o mesmo pode ser substituído), ou pelo valor do bem, em face da sua responsabilidade pela guarda do objeto[5].

 A benfeitoria realizada pelo comodatário em bens emprestados, sem autorização do comodante, não gera direito à indenização ao comodatário, conforme entendimento dos tribunais pátrios. Assim, se o comodatário fizer up grade nos computadores emprestados que acarretem mais valia, mas não pedir autorização prévia para a comodante, não terá direito à indenização[6].

Em que pese o comodato não exigir a formalização de um contrato escrito, é imprescindível, para fins tributários, que seja celebrado um contrato por escrito entre comodante e comodatário, com prazo determinado, eis que uma das características do comodato é a temporalidade, ou seja, a coisa emprestada deve ser devolvida após determinado tempo, do contrário se caracteriza como doação, que tem incidência tributária.

Assim, para que não seja caracterizada fraude, o contrato de comodato realizado entre empresas do mesmo grupo econômico deve observar o acima exposto, e a empresa deve buscar a orientação de profissional da área jurídica para assessorá-la na operação e evitar futuros aborrecimentos com o fisco.

Viviane da Silva Coelho Vasques
MBA em Direito Empresarial
Advogada



[1] RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. COMODATO. NÃO-CONSTITUIÇÃO DO FATO GERADOR. BENS DESTINADOS AO USO E CONSUMO. CREDITAMENTO.
ESTORNO. DESCABIMENTO.
1. "Não constitui fato gerador do imposto de circulação de mercadorias a saída física de máquinas, utensílios e implementos a título de comodato". (Súmula 573/STF) 2. Deveras, a transferência de bens do ativo permanente, no âmbito da mesma empresa, não constitui fato gerador do ICMS, sendo indevido o crédito relativo a eles.
3. Consoante a Súmula do Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência do Eg. STJ, o pleito da parte é não ser instada a estornar, exatamente porque aquilo não gera o crédito que imporia, por força do princípio da cumulatividade, a compensação da operação subseqüente.
4. Recurso Especial parcialmente conhecido, e provido.
(REsp 791.491/MG, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/09/2006, DJ 07/11/2006, p. 252)

[2] EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. OPERAÇÃO DE COMODATO. INOCORRÊNCIA DO FATO GERADOR DO ICMS. INEXISTINDO FATO GERADOR DO ICMS, QUE E A OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DA MERCADORIA COM TRANSFERÊNCIA DE PROPRIEDADE, NÃO É DEVIDO O IMPOSTO E, VIA DE CONSEQÜÊNCIA, NÃO INCIDE A MULTA POR INFRAÇÃO MATERIAL À LEI TRIBUTARIA. À unanimidade, negaram provimento ao apelo, confirmando a sentença em reexame necessário. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70007502289, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 07/04/2004)

[3] Art. 579. O comodato é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis. Perfaz-se com a tradição do objeto.
[4] Art. 582. O comodatário é obrigado a conservar, como se sua própria fora, a coisa emprestada, não podendo usá-la senão de acordo com o contrato ou a natureza dela, sob pena de responder por perdas e danos. O comodatário constituído em mora, além de por ela responder, pagará, até restituí-la, o aluguel da coisa que for arbitrado pelo comodante.
[5] COMODATO. BEM MÓVEL. DEVOLUÇÃO. Caracterizado o contrato de comodato relativamente à bem móvel, cabe ao comodatário sua restituição, não sendo afastada mesmo quando venha ocorrer eventual alegação de furto. Recurso provido. (Recurso Cível Nº 71000814475, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 18/01/2006)
CONSUMIDOR. COMODATO DE APARELHO RECEPTOR DE SINAL DE TV. FURTO EM RESIDENCIA. RESPONSABILIDADE PELA GUARDA DO BEM QUE COMPETE AO COMODATARIO. FATO DE TERCEIRO. INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 238 DO CC. - RECURSO NÃO PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71002054583, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Leila Vani Pandolfo Machado, Julgado em 24/06/2009)
[6] Benfeitorias realizadas sem a autorização do comodante. O comodatário não tem direito a retenção, nem de ressarcimento de benfeitorias realizadas para a sua própria comodidade e benefício, sem o consentimento do comodante (ADCOAS 73783, 1980). No mesmo sentido: Benfeitorias não indenizáveis ao comodatário, se não se configurar hipótese de despesas extraordinárias e urgentes, nem forem as mesmas autorizadas pelo comodante; se o fossem, não dariam direito a retenção, como reconhece a doutrina (JB 79/1985).
As despesas feitas pelo comodatário, com fruição da coisa emprestada, nos termos do art. 1.254 (novo, art. 584) do CC, são as ordinárias, para sua conservação normal e manutenção regular. Despesas outras realizadas sem consentimento do comodante, ainda que impliquem a mais-valia do bem, só são indenizáveis se urgentes e necessárias, quando se classificam como extraordinárias (RT 790/227).

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Artigo Notícia da edição impressa de 10/01/2012

Alteração do art. 6º da CLT

Viviane Coelho Vasques

Em 16 de dezembro de 2011, foi publicada a Lei de 12.551, chamada de Lei do Home Office, que altera o texto do art. 6º da CLT, igualando os trabalhos realizados a distância aos trabalhos desempenhados no estabelecimento do empregador, desde que presentes os pressupostos da relação de emprego. A lei acrescenta, ainda, o parágrafo único, equiparando os meios telemáticos e informatizados de comando aos meios pessoais e diretos de comandos, controle e supervisão de trabalho. A nova lei atualiza o arcabouço legal trabalhista, pois o trabalho remoto é uma tendência mundial que cresce a cada dia, devido ao desenvolvimento tecnológico. O Home Office utilizado corretamente, sem abusos, traz inúmeros benefícios à empresa e ao empregado. À empresa, porque diminui os custos de manutenção de um empregado instalado nas suas dependências, e ao empregado, porque diminui as despesas deste com deslocamento diário (casa/trabalho/casa).
Além, é claro, de aumento na qualidade da prestação dos serviços, pois o empregado não precisará enfrentar diariamente o trânsito caótico para chegar à empresa, reduzindo impontualidades e/ou estresses. Inúmeras pesquisas constataram que o estresse é responsável por um número significativo de afastamentos ao trabalho, o que é prejudicial para a empresa. Assim, as empresas não precisam se preocupar com o advento da nova lei, uma vez que tal entendimento estava sendo aplicado pelos tribunais, a lei apenas corroborou a jurisprudência. Basta respeitar a jornada de trabalho dos empregados, que a lei trará muitos benefícios, especialmente, a diminuição de custos.

Advogada

Fonte: Jornal do Comércio. Publicado em 10/01/2012